quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

O custo do não-discipulado



Em 1937, o teólogo alemão Dietrich Bonhoeffer publicou seu famoso livro “O Custo do Discipulado”. Uma exposição do Sermão do Monte, na qual ele comenta o que significa seguir a Cristo. O contexto era a Alemanha no início do nazismo. Sua preocupação era combater o que ele chamou de “graça barata”, essa graça que oferece perdão sem arrependimento, comunhão sem confissão, discipulado sem cruz. Uma graça que não implica obediência e submissão a Cristo. Seu compromisso com Cristo e sua cruz o levou a morte prematura em abril de 1945.

“O Custo do Discipulado” é um livro que precisa ser lido pelos cristãos brasileiros do século 21, com sua fé secularizada, sua moral relativizada, sua ética minimalista e sua espiritualidade privada e narcisista. A “graça barata” tem nos levado a conceber um cristianismo medíocre e uma espiritualidade que não expressa a nobreza do reino de Deus.

A fé cristã não é o produto de uma subcultura religiosa. Também não é apenas um conjunto de dogmas e doutrinas que afirmamos crer. É , antes de tudo, um chamado de Cristo para segui-lo. Um chamado para tomar, cada um, a sua cruz de renúncia ao pecado e obediência sincera a tudo quanto Cristo nos ensinou e ordenou. 

Muitos olham para este chamado e reconhecem que o preço para seguir a Cristo é muito alto. Esta foi a preocupação de Bonhoeffer. De fato é. Amar os inimigos, abençoar os que nos rejeitam, orar por todos os que nos perseguem, sem dúvida é muito difícil. Perdoar os que nos ofendem, resistir as tentações, buscar antes de qualquer outra coisa o reino de Deus e sua justiça e fazer a vontade de Deus aqui na terra como ela é feita nos céus, não é fácil. Resistir aos impulsos consumistas numa cultura hedonista, preservar uma conduta moral e ética elevada em meio a tanta corrupção e promiscuidade definitivamente tem um preço muito elevado. Porém, precisamos ver tudo isto por outro ângulo.

Se o custo do discipulado é alto, já imaginou o custo do não-discipulado? Se amar o inimigo é difícil, tente odiá-lo! Se honrar pai e mãe é custoso, pense na possibilidade de não fazê-lo! Se viver em obediência a Cristo, renunciando o pecado, exige muito, procure ignorar isto! 

Vivemos hoje uma sociedade enferma. O número de divórcios aumenta cada dia. O número de filhos que desconhecem o pai é alarmante. As doenças de fundo emocional multiplicam-se. A violência cresce. A corrupção parece não ter fim. Os transtornos psíquicos na infância assustam os especialistas. A raiz da enfermidade pessoal e social, em grande parte, é o não-discipulado. Não considerar os mandamentos de Cristo, seu magnífico ensino no Sermão do Monte, seu chamado para a renúncia ao pecado e a necessidade de diariamente tomar a cruz da obediência para segui-lo tem um custo incalculavelmente maior. 

Jesus nos conta a parábola de um homem que descobriu um grande tesouro que estava escondido em um campo. Com muita alegria, tomou tudo o que tinha, vendeu e, com o dinheiro, comprou o campo e com ele seu tesouro. Desfazer de tudo o que tinha foi uma decisão fácil tendo em vista o tesouro que iria adquirir. Só iremos compreender a importância da contrição e do arrependimento, da confissão e da renúncia ao pecado, da obediência aos mandamentos e do valor da cruz se tivermos consciência da riqueza que nos espera. 

Pagamos um alto preço pela “graça barata”. Nossas famílias sofrem por causa dela. Nossos filhos encontram-se confusos e perdidos. A nação afunda-se na lama da corrupção, da violência e da promiscuidade. Nossas igrejas transformaram-se em centros de entretenimento religioso, com um comércio de falsas promessas em troca de um evangelho sem cruz e de um reino onde cada um é seu próprio rei.

O chamado de Cristo para sermos seus discípulos, com seu “alto custo”, é o único caminho possível para a liberdade. A única opção para a verdadeira humanidade. A única esperança para nossa sociedade enferma. Se seguir a Cristo exige muito, lembre que não segui-lo vai lhe custar muito mais.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

495 anos de Reforma que precisa ser Reformada


“Pois vocês são salvos pela graça, por meio da fé, e isto não vem de vocês, é dom de Deus.” 
(Efésios 2.8)
 
No dia 31 de outubro comemoraremos os 495 anos dos inícios do movimento que ficou conhecido como Reforma Protestante. Desde aquela data em 1517 o mundo jamais foi o mesmo. Os eventos que se seguiram à afixação das 95 teses de Martinho Lutero às portas da catedral de Wittemberg, foram, depois de Pentecostes, os maiores acontecimentos do cristianismo. 
 
Evidentemente que com isso não queremos afirmar que desde o derramamento do Espírito como cumprimento da promessa de Jesus, até o século 16, nada de bom existiu na Igreja, longe disso. É inegável a doutíssima contribuição de homens como Policarpo de Esmirna, Inácio de Antioquia, Irineu de Lião, Justino, Clemente, Atanásio, Crisóstomo, Ambrósio, Agostinho, Gregório de Nissa, Gregório Magno, Leão Magno, apenas para citar os pais da Igreja. São deste tempo os  grandes Concílios da Cristandade: Eféso, Níceia, Calcedênia, Constantinopla I e II, a definição do cânon da Bíblia com seus 66 livros, as primeiras traduções da Bíblia para uma língua popular: a Vetus Latina e a Vulgata, as catequeses, comentários aos livros bíblicos, sermões e instruções eclesiásticas. A Idade Média também testemunhou grandes vultos da Igreja: Gregório VII, Bernardo de Claraval, Boaventura, Columbano, Francisco de Assis, Alberto Magno, Pedro Lombardo e Tomás de Aquino, deste período podemos destacar as Sumas Teológicas e os compêndios sobre a vida espiritual que buscavam sistematizar o imenso patrimônio da fé vivida e transmitida ao longo dos séculos. 
 
Entretanto, a Igreja, não obstante os seus luminares, afastou-se progressivamente da fonte de todo conhecimento e verdade que são as Sagradas Escrituras. Este afastamento se deu não só entre o clero, o que já seria uma tragédia, mas ela desapareceu por completo das mãos, das mentes e dos corações dos homens e mulheres do século XVI. O culto, sem Bíblia, era sem vida e sem inspiração. O misticismo predominava, não havia instrução e com isso a ignorância e a imoralidade grassavam entre o povo e entre o clero, a situação caótica e a falência da civilização era o exato reflexo do colapso de um cristianismo sem Bíblia! 
 
Naqueles dias, Deus que é rico em misericórdia, levantou e serviu-se de um homem de personalidade singular, o então monge agostiniano Martinho Lutero cuja piedade e o histórico espiritual eram a síntese mais perfeita de um cristão daquele tempo: um homem desesperado, falido, sem esperanças, atormentado, nas trevas da ignorância, não obstante a sua refinada intelectualidade. Redescobrindo a Bíblia e nela o Deus santo e misericordioso e sua graciosa salvação, a partir de si mesmo, Lutero viveu e deu início por meio de sua pregação, em meio a muitas e algumas inglórias batalhas, ao evento que, tornando conhecidas as Escrituras e as suas exigências no culto e na obediência, a Reforma da Igreja, que se verificou mais tarde, ser muito mais que isto, foi também a fundação de uma nova civilização e de uma nova humanidade. 
 
Os ventos da Reforma não varreram apenas a Igreja, mas também principados, reinos e Estados. Transformou a educação, a economia, a política, as artes, a filosofia e a estética. 495 anos depois, a Reforma permanece uma necessidade e uma tarefa inacabada. Seu lema mais conhecido é também a sua verdade mais imperiosa: A Igreja Reformada, sempre necessitará reforma-se. Isto é, a cada geração, devido a nossa pecaminosidade, precisamos do auxílio do Espírito Santo para fazer-nos redescobrir a eterna novidade das Escrituras e seu inerrante e indefectível padrão e conduta e prática para o cristão, a Igreja e a sociedade humana. 
 
A melhor maneira de homenagear a memória de nossos heróis reformadores, muitos dos quais deram as suas vidas pela verdade (Wicllife, J. Huss, Savanarola,Zwinglio, os Huguenotes,  os mártires da Guanabara) é apegar-nos com mais radicalidade à Bíblia e obedecer a instrução de Tiago: “Sejam praticantes da Palavra, e não apenas ouvintes, enganando-se a si mesmos” (Tg 1.22).

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Luiz Fernando dos Santos já foi monge cisterciense e padre católico. Hoje é pastor-mestre da Igreja Presbiteriana Central de Itapira (SP).

sábado, 20 de outubro de 2012

O que a felicidade não é



A ideia errônea do que é a verdadeira felicidade pode vir a ser a principal causa da infelicidade. Convém apontar o que a felicidade “não é”:

- A felicidade não tem ligação com a ausência de embaraços, dificuldades, imprevistos, oposição ou embates. Antes, a presença destas coisas exercita e valoriza a vida. Muitas vezes quebram a rotina e servem de degraus para que alcancemos posições mais altas.

- A felicidade não depende de circunstâncias favoráveis. Se fosse circunstancial, ela seria instável, transitória, incerta. Ela não se apoia em fatores que nem sempre estão sob o controle humano.

- A felicidade não é resultado da satisfação de todo desejo do coração. Os nossos desejos frequentemente são contraditórios e surgem de fontes opostas entre si. Qualquer pessoa descobre que a não satisfação de certos desejos, conquanto fortes e audaciosos, resulta em extraordinária felicidade. 

- A felicidade não significa uma aceitação silenciosa e compulsória das dificuldades existentes, como se fossem determinadas por Deus. A resignação é virtude cristã e preciosa, mas não deve ser confundida com a indisposição para a luta ou com o medo, com a covardia ou a falta de fé. 

- A felicidade nunca acontece em uma sala fechada em cuja porta, do lado de fora, uma tabuleta avisa: “Não entre sem ser chamado”. A felicidade não depende do isolamento, do silêncio, de calmarias, de acessórios e assessores, da ginástica do chamado “pensamento positivo”, da repetição mecânica de orações e de frases otimistas, de mentiras inteligentes e bem elaboradas. Ao contrário, a felicidade tem de conviver com a maldade, com o sofrimento, com a inimizade alheia, com a morte, com a realidade presente e histórica.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

A alegria cristã

O povo de Deus é alegre por definição. O cristão é alguém que foi encontrado por aquele que é feliz e recuperou a sua posição como filho. Para os cristãos, a alegria não é só uma opção de vida. É uma ordem de Deus ao seu povo; é um bom testemunho; é pré-evangelização; é coerência.

O mandamento da alegria está espalhado nas Escrituras Sagradas: nos livros da lei (Dt 16.11), nos Salmos (Sl 32.11), nos profetas (Zc 9.9), nos Evangelhos (Lc 10.20), nas Epístolas (Fp 4.4) e no Apocalipse (Ap 19.7). A alegria é também fruto do Espírito (Gl 5.22), é consequência do perdão e da salvação (Lc 10.20), é promessa a ser totalmente contemplada no futuro (Hb 11.39-40), é combustível e celebração da missão (Sl 126.6; Lc 15.7).

Certamente, algumas vezes terá de ser uma alegria disciplinada, baseada em promessas e em exercícios de fé. A despeito de ser -- por natureza -- feliz, cabe ao cristão desenvolver esta alegria. Isto pode ser feito por meio do exercício de um espírito grato (aqueles que julgam que a vida lhes deve alguma coisa são incapazes de ser felizes), pela lembrança constante das promessas do Senhor, pelo encontro amoroso com os irmãos e irmãs, pela contemplação da Criação, pela memória de Cristo e de sua beleza, pela comunhão diária com Deus por meio da oração e da leitura bíblica, pela vivência do discipulado cristão, pelo “enchimento” do Espírito.

Por causa do pecado, da depravação humana, da ordem política e social injusta, da incredulidade, da atuação satânica, do orgulho humano, da fome e da miséria, das vicissitudes naturais da vida, da enfermidade e da morte, da rejeição do evangelho -- nem todo tempo é tempo de alegria. A Bíblia ressalta esta verdade: “[Há] tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de prantear, e tempo de saltar de alegria” (Ec 3.4).

Além disto, somos ainda seres incompletos, ambíguos, divididos. Um dos efeitos da queda é que nossas emoções nem sempre acompanham nossas certezas. A variação de humor que não dominamos continuará a ser nossa companheira até o final da vida. A plenitude da alegria não é para agora. A garantia de bem-estar permanente não é uma promessa cristã.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Aprender a Esperar...


É de suma importância aprender a esperar o desenrolar dos acontecimentos. Eles estão em fila e obedecem a uma ordem pré-estabelecida, como se fosse uma peça de teatro, cujos personagens entram no palco no momento exato. Chama-se de notícia o acontecimento que acaba de se dar. Chama-se de história a soma e o significado de uma série de acontecimentos dentro de certo período de tempo. Chama-se de precipitação a infeliz interferência na ordem certa dos acontecimentos.
Os acontecimentos são como elos de uma corrente. Eles são sucessivos, um após outro. A seqüência deles é esclarecedora e diretiva. Os acontecimentos abrem e mostram o caminho pelo qual se deve andar. Deus revela o seu plano não de uma vez, mas progressivamente, por meio de acontecimentos nem sempre previstos e aguardados. Muitas vezes Deus mostra o resultado final mas não revela com antecedência os detalhes do itinerário que se deve seguir nem as etapas pelas quais há de se passar.
Foi assim com a chamada de Abraão. Era para ele sair da sua terra, da sua parentela e da casa de seu pai, para uma terra que Deus lhe mostraria posteriormente (Gn 12.1). Como conseqüência, Abraão seria uma bênção para todas as famílias da terra. Deus não lhe deu, todavia, o plano de viagem nem a pauta que deveria cumprir. Isso viria depois, com a marcha dos acontecimentos.
Rute, a viúva moabita, aprendeu com a sogra a arte de aguardar os acontecimentos. Noemi havia ensinado a ela: “Espera, minha filha, até que saiba em que se darão as coisas” (Rt 3.18). Tanto Rute como Boaz sabiam esperar e não atropelavam os acontecimentos, até mesmo na questão de sexo antes do casamento. Embora tenham ambos passado uma noite inteira a sós na eira, sendo ele solteiro e ela uma jovem viúva, e estando ela perfumada e vestida com a melhor roupa (Rt 3.3), Boaz só coabitou com Rute depois de a haver desposado (Rt 4.13). O sexo na eira seria algo brutal e precipitado, pois os dois estavam ainda acabando de se conhecer.

>>> Retirado de Pastorais Para o Terceiro Milênio (Editora Ultimato)

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Decisões além do óbvio


A Bíblia está repleta de iniciativas e decisões que mudaram a vida de pessoas, países e gerações. Algumas foram complexas - como peregrinar por um deserto, empreender uma guerra ou enfrentar um gigante -, outras foram mais simples - como parar ao longo de um caminho para ajudar um homem caído. Foram, porém, decisões transformadoras.
 
Erramos ao pensar que as decisões são tomadas com base em nossa vontade. Apesar de a vontade exercer um papel fundamental em nossas vidas, frequentemente ela não se mostra forte o suficiente para nos guiar em uma decisão acertada e transformadora. Quantas vezes tivemos sincera vontade de fazer algo notadamente de grande importância e não o fizemos? Decisões são mais frequentemente tomadas com base em nossos princípios - aquilo que determina o que cremos, que resume o nosso sentido de vida e nos impulsiona a fazer o improvável.
 
Lucas, no capítulo 10, apresenta-nos quatro personagens distintos na estrada entre Jerusalém e Jericó: um necessitado caído à margem da estrada, um sacerdote, um levita e, por fim, um samaritano. É nesta pequena história que encontramos o reflexo da nossa própria humanidade: virtudes a serem celebradas e o natural engano do coração que nos impede de ver o mundo com os olhos do Pai. 
 
O sacerdote e o levita possuíam uma função para a qual foram chamados. Eram homens separados para o serviço do Reino e ocupados com as coisas do Reino. Possuíam um salário e também um público que esperava que cumprissem suas funções. Eram os homens do culto, das celebrações e das cerimônias religiosas. Estavam, porém, tão absortos no cumprimento da própria agenda que perderam de vista o motivo da vocação. Eles se esqueceram de que pessoas são mais importantes que coisas, que uma alma vale mais que o mundo inteiro. 
 
Em uma sociedade ativista, consumista e hedônica como a nossa, talvez este seja nosso maior desafio: perceber aqueles que estão caídos, enquanto seguimos apressados para o próximo compromisso. Jesus repetidamente ensinou aos seus discípulos que eles deveriam atentar para os órfãos, viúvas, encarcerados, enfermos, famintos, sedentos, excluídos e perdidos. Jesus, com isso, nos ensinou que devemos ter os olhos abertos para os que se encontram nas margens dos caminhos.
 
Não caía bem a um samaritano ajudar um judeu, opressor do seu povo. Seria ele visto como um entreguista, um colaborador do inimigo, ou mesmo um bajulador de Israel? Ajudar o inimigo não lhe traria aplausos. O certo é que ele estava disposto a sacrificar sua reputação tomando esta decisão transformadora: parar e ajudar a figura mais improvável.
 
Facilmente nos impressionamos com histórias, biografias e ministérios que não impressionam a Deus. Isso acontece porque nos comovemos com resultados visíveis, mensuráveis e que geram prestígio, bem como com processos ligados às multidões, holofotes e aplausos.  Parece-me, porém, que no exemplo de Jesus – e do samaritano – o verdadeiro amor do Pai ocorre com frequência em lugares bem menos frequentados. Lugares onde Jesus encontrou um cego próximo a Jericó, uma mulher samaritana ao lado de um poço e um coletor de imposto odiado pelo próprio povo. Deus vê o coração. Talvez estejamos aplaudindo o sacerdote e o levita, que seguiam rápido, provavelmente para um grande culto, mas Deus se agradou do samaritano que parou.
 
Identidade é um elemento que contribui tremendamente para tomada de decisões diárias. Para aquele samaritano, sua história lhe dizia que aquele caído era seu inimigo e que este dia era o momento da revanche. Mas, parece-me que ele possuía uma imagem real de si mesmo, que ia além da história contada pelos seus pais, sua sociedade, seu sobrenome e seu contexto. Ele agiu como alguém que crê que sua identidade é definida por Deus. Ele não se viu naquele dia como um oponente, mas como um ajudador. Não enxergou o homem caído como um estranho distante, mas como o seu próximo.
 
Talvez a sua história lhe diga coisas tristes a seu respeito. Talvez seus pais, amigos, inimigos, os fatos da vida ou seu próprio inconsciente colaborem para construir em você uma autoimagem baixa demais, alta demais, ou simplesmente irreal. A Palavra nos diz, porém, que em Cristo temos uma nova identidade. Somos os amados do Pai, herdeiros com Cristo, vencedores em Deus, sal da terra e luz do mundo, criados para a Sua glória, alvos preferenciais do amor do Eterno. Somos mais que samaritanos opressos, somos filhos de Deus que podem ter os olhos abertos para os caídos ao longo do nosso caminho. A oração a ser repetida a cada dia, neste caso, é justamente esta: Senhor, abra os olhos do meu coração.
Ronaldo Lidório é doutor em antropologia e missionário da Agência Presbiteriana de Missões Transculturais e da Missão AMEM. É organizador de Indígenas do Brasil -- avaliando a missão da igreja e A Questão Indígena -- Uma Luta Desigual.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Como será a igreja evangélica brasileira de 2040?


Saiu nos jornais o resultado de uma pesquisa do IBGE com dados interessantes sobre a realidade evangélica no Brasil. O dado que mais nos chamou a atenção é o que diz respeito à categoria evangélica que mais cresce: o “evangélico sem igreja”. A maior parte desse grupo não é de evangélicos “nominais” (os que se autodenominam evangélicos, mas não frequentam uma igreja); antes, é composta pelos que se consideram evangélicos, mas não se identificam com denominação alguma. Longe de ser “nominal” ou “não-praticante”, o evangélico sem igreja talvez frequente várias igrejas sem se definir por uma; ou pode ser que assista a uma igreja durante alguns meses, antes de passar facilmente a outra. Com isso, não chega a se sentir assembleiano ou batista ou presbiteriano ou quadrangular. Existe, então, um setor crescente de pessoas que se identificam como evangélicas, mas não como pertencentes a uma determinada denominação.
 
Há também outra tendência que logo vai aparecer. Ainda não temos os resultados religiosos do Censo de 2010, mas as pesquisas recentes indicam que a porcentagem de evangélicos continua crescendo -- não no ritmo dos anos 90 (que foi inteiramente excepcional), mas voltando ao ritmo de crescimento que caracterizou os anos 50, 60, 70 e 80. Contudo, esse crescimento um dia vai parar. Tal afirmação não é uma questão de “falta de fé”! Mesmo estatisticamente, nenhum processo de crescimento pode durar para sempre. Percebemos, pelas tendências atuais, que o fim do crescimento evangélico no Brasil pode não estar distante. De cada duas pessoas que deixam de se considerar católicas, apenas uma passa a se considerar evangélica. Além disso, evidentemente, a Igreja Católica não está a ponto de desaparecer. Fenômenos como a Canção Nova e outros testemunham disso; ou seja, há formas de catolicismo que arrebanham muita gente. É verdade que o catolicismo continua diminuindo numericamente, mas principalmente entre adeptos nominais ou de vínculo fraco. Existe um núcleo sólido que não está desaparecendo e que constitui, provavelmente, em torno de 25 a 30% da população. Pelas tendências atuais, será difícil que os evangélicos, que hoje são em torno de 20%, passem de 35% da população.
 
Tudo isso significa que logo vivenciaremos uma nova fase da religião evangélica no Brasil. Estamos desde os anos 50 na fase do crescimento rápido. (Antes dos anos 50 as igrejas não cresciam tanto.) Crescimento rápido significa que a igreja média tem poucas pessoas que nasceram evangélicas, mas muitas que se converteram, inclusive que acabaram de se converter. Essa situação é privilegiada sob muitos aspectos, mas também tem certas implicações. Quando terminar a fase do crescimento rápido -- provavelmente nas próximas duas ou três décadas --, haverá outro perfil em uma igreja média: mais pessoas que “nasceram na igreja” e menos que se converteram ou que acabaram de se converter. Com isso,  muitas coisas mudarão. O perfil de liderança eclesiástica exigida mudará. O crescimento rápido privilegia certo tipo de líder: o que tem um ministério capaz de atrair novos membros. Isso, claro, é muito importante, e sempre haverá espaço para esse tipo de líder. Porém, com a estabilização da igreja, haverá mais espaço para outras modalidades de liderança. E, como sabemos pelo Novo Testamento, os ministérios na igreja são múltiplos e variados. Não devemos ter uma linha de montagem de líderes cristãos com todos exatamente iguais. Temos de abraçar a variedade de ministérios e de tipos de líder evangélico. 
 
Por que no futuro uma variedade de tipos de líder será ainda mais importante? Quando as igrejas crescem muito, a exigência é fazer bem o bê-á-bá, pois há sempre pessoas novas chegando. Entretanto, quando há uma comunidade estabilizada numericamente, com mais pessoas com muito tempo de vivência evangélica, outras exigências ganham força. “Entre a conversão e a morte, o que tenho de fazer? Como desenvolvo a minha fé? Como devo crescer nas mais variadas áreas? O que significa ser discípulo de Cristo em todas as dimensões da vida? O que a fé evangélica tem a dizer sobre as questões que agitam a sociedade?” Haverá, então, mais exigência por um ensino variado e por pessoas que saibam falar para a sociedade em nome da fé evangélica. Precisaremos de pessoas preparadas nas mais diversas áreas de interface com a sociedade; portanto, precisaremos de ministérios cada vez mais diversificados. Esse tipo de líder não aparece da noite para o dia, pois a formação leva tempo. O carisma e o autodidatismo não bastam nesses casos.
 
Além disso, será cada vez mais importante a questão da transparência: primeiro, porque é uma demanda do próprio evangelho e, segundo, porque (queira Deus!) o Brasil de 2040 terá uma democracia mais limpa e transparente. Os líderes evangélicos do futuro precisarão ter vida pessoal capaz de ser examinada. Haverá menos tolerância para o líder inacessível e opaco, que vive atrás das máscaras. Em vez disso, uma liderança mais exposta e vulnerável será exigida. E as técnicas não ajudam nisso. O que produz esse tipo de líder é um profundo processo de formação pessoal, que leva tempo. 
 
Se não houver pessoas à altura, é possível que, quando terminar o crescimento rápido, em vez de uma comunidade evangélica estabilizada em torno de 35% durante gerações e com um efeito benéfico profundo na vida do país, haja um decréscimo na porcentagem de evangélicos. A curva numérica que agora ascende rapidamente pode cair de forma igualmente rápida. O evangélico ingênuo, que acha que isso nunca poderá acontecer, desconhece a história da igreja cristã, pois isso aconteceu algumas vezes em outros países. Se não tivermos um olhar para o futuro, para perceber os desafios de amanhã e nos preparar hoje para eles, a probabilidade é que esse declínio aconteça. 
 
Portanto, o primeiro desafio de hoje em função do futuro é formar um leque de tipos de líder, com ministérios variados, mas sempre humildes e com vidas transparentes. E o segundo desafio é a recuperação da Bíblia. A identidade evangélica não deve estar ligada meramente a uma tradição que se chama evangélica. Antes, ser evangélico significa a vontade de ser verdadeiramente bíblico, em todas as dimensões da vida com Cristo. E a Bíblia é um grande país, um terreno vasto, que precisamos conhecer por inteiro. Todavia, perdemos muito o sentido de ser bíblico. É raro hoje ouvir sermões verdadeiramente embasados na Bíblia. São mais comuns aqueles que nem sequer partem da Bíblia, ou aqueles em que o pregador lê um texto bíblico para depois falar de outro assunto. É incomum a interação séria com o texto bíblico, em que se deixa o texto falar para depois se fazer as aplicações para a vida pessoal, comunitária e social. É raro porque é difícil. Esse tipo de mensagem requer formação, preparo, pensamento, meditação. Via de regra, na fase atual do crescimento rápido, é mais fácil não fazer tudo isso, se preocupar apenas em ter uma igreja cheia.
 
Em um futuro próximo, porém, esse enfoque será cada vez mais necessário. Se não recuperarmos a capacidade de interagir com o texto bíblico, de deixá-lo falar a nós e, a partir disso, tirar as implicações individuais, eclesiásticas e nacionais, nos mostraremos irrelevantes. Assim, é possível que a curva decline logo após a estabilização, pois a capacidade de estudar e ensinar a Bíblia é algo que não se constrói da noite para o dia. É necessário exigirmos de nossos líderes que ensinem a Palavra, que interajam profundamente com o texto bíblico, que não fujam! Contudo, o bom ensino na igreja precisa também ser complementado pela leitura individual. É fundamental adquirir menos livros água com açúcar ou triunfalistas e mais leituras que nos embasem biblicamente. 
 
O processo, portanto, tem de começar com os membros comuns exigindo uma melhor qualidade de ensino e de literatura. A nova liderança para fazer frente aos desafios de 2030 e 2040 só vai surgir se houver uma demanda articulada a partir dos membros das igrejas. 
Dentro do tema da recuperação da Bíblia, insisto na centralidade dos Evangelhos. Comenta-se que a fé evangélica se tornou prisioneira da cultura religiosa da barganha. Ora, uma das maneiras de superar a cultura da barganha é incentivar a dedicação a uma causa (como fazem os movimentos políticos mais ideológicos). O problema, neste caso, é a persistência ao longo do tempo, a capacidade de continuar dedicado a ela durante décadas e apesar dos contratempos. Porém, existe uma outra maneira de combatermos a cultura religiosa da barganha: encantando-nos com a figura de Cristo, com a humildade amorosa de sua figura humana retratada nos quatro Evangelhos. O melhor antídoto para a cultura da barganha é o fascínio por Cristo, que advém do estudo sério dos Evangelhos.
 
A igreja evangélica brasileira de 2040 precisará, portanto, de líderes mais diversos nos seus dons, profundos no seu conhecimento e sabedoria e transparentes nas suas vidas; e precisará ter redescoberto o verdadeiro sentido de ser evangélico, que é a vontade de ser profundamente bíblico em toda a nossa existência. Esses dois requisitos existirão se a igreja de hoje tomar as medidas necessárias.
 
• Paul Freston, inglês naturalizado brasileiro, é professor colaborador do programa de pós-graduação em sociologia na Universidade Federal de São Carlos e professor catedrático de religião e política em contexto global na Balsillie School of International Affairs e na Wilfrid Laurier University, em Waterloo, Ontário, Canadá.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Compromisso Radical


Tema da semana: A dúvida que conduz à fé autêntica 
quarta-feira junho 20, 2012



O versículo-chave da Bíblia: 
Mas Tomé disse: "Primeiro, eu preciso ver as cicatrizes dos cravos em suas mãos e tocá-los com o meu dedo, devo colocar a minha mão onde a lança entrou em seu lado, não acreditarei se não fizer isso..! " (João 20:25, CEV) Dig Deeper: João 20:19-25
Jesus não ficou irado com Tomé. Em vez disso, ele convidou Tomé para tocar suas feridas.
O apóstolo, que muitos consideram o mais fraco crente do grupo acabou por ser um dos poucos que realmente era capaz de tocar as chagas de Cristo. Tomé se atreveu a questionar por causa de sua própria alma, e Deus foi gracioso o suficiente para lhe dar as respostas e as provas que precisava.
Tomé teve uma dúvida temporária e não uma vida de dúvida. De acordo com a tradição da igreja, Tomé viajou para a parte sul da Índia como missionário. Ele morreu ali como um mártir. A dúvida de Tomé foi trocada por um compromisso radical de viver para Cristo.
Posso imaginá-lo na ponta do sul da Índia, testificando aos seguidores do hinduísmo sobre o dia em que ele pode tocar as feridas de Jesus. Talvez ele finalizasse seu sermão dizendo: "Pelas suas chagas eu fui curado". No momento em que Tomé chegou à Índia, ele acreditava o suficiente para morrer por Cristo. Na dúvida Tomé encontrou algo digno que lhe deu significado e convicção para sua vida e morte.

-Johnnie Moore em Honestamente

Minha resposta: Que perguntas eu tenho que eu desejo que Deus responda?

Aplicação: O Senhor amou o seu apóstolo o suficiente para voltar e oferecer as mãos perfuradas para tocar. Ele não repreendeu Tomé por suas dúvidas. Ele deu-lhe uma forma de acreditar. Maureen-Lang (escritor)



0Oração da Semana

Querido Pai, ajuda-me a ser honesto sobre as minhas próprias dúvidas e perceber que Tu não rejeitas ninguém para fazer perguntas honestas, por favor, use as minhas dúvidas e perguntas para aprofundar a minha fé e me chamar para mais perto de Ti.


Adaptado de: Honestly (Harvest House, 2011) by permission. All rights reserved by the copyright holder and/or the publisher. May not be reproduced.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Uma reviravolta na igreja brasileira aqui e agora!

A história do povo de Deus hoje não é diferente daquela vivida no Antigo Testamento. Em dois mil anos de história (de Jesus aos dias atuais), a igreja tem cometido muitos desacertos. Nos dois mil anos anteriores (de Abraão a Jesus), Israel também cometeu outros muitos erros.

Os escândalos do povo eleito estão registrados no Antigo Testamento e os da igreja, no Novo Testamento e nos compêndios da história eclesiástica.

O ser humano é o mesmo desde a queda, quando afundou na rebelião, tanto nos dois milênios antes de Cristo como nos dois milênios depois de Cristo. Deus também é o mesmo, ontem e hoje. Ele é continuamente misericordioso, “as suas misericórdias são inesgotáveis” e “renovam-se cada manhã” (Lm 3.22-23). Por isso, os crentes da Antiga e da Nova Aliança não são consumidos. Porque Deus é Deus, ele “leva adiante seus propósitos em meio à perversidade dos homens”. A história mostra que “a maldade humana e a providência divina não são incompatíveis” (John Stott).

Alguém precisa escrever um livro contando a história das reviravoltas positivas na história do povo de Deus. Uma reviravolta após outra, numa sucessão imprevisível, depois de longos ou pequenos intervalos, é o que tem mantido a igreja viva. A reviravolta acontece de surpresa, muitas vezes quando o declínio chega ao ápice ou quando a escuridão atinge seu ponto mais alto.

Na maioria das vezes, a reviravolta começa de baixo para cima e não o contrário. Via de regra, não são os sábios, os poderosos e os nobres, segundo os padrões humanos, os primeiros a desejar e a participar da renovação espiritual da igreja, fato observado e registrado por Paulo (1Co 1.18-31).

A reviravolta que marca uma mudança para melhor não é outra coisa senão a repetição de uma reviravolta anterior, com menor ou maior intensidade. Trata-se da recuperação da rota perdida, do entusiasmo perdido, da santidade perdida e da consagração perdida. É a feliz volta ao primeiro amor (Ap 2.4). Daí a famosa oração de Habacuque: “Nesta hora em que precisamos tanto de ajuda, ajude-nos novamente como fez no passado!” (Hc 3.2, BV).

O pior período da história de Israel foi aquele que precedeu e causou a queda de Jerusalém, por ocasião da invasão babilônica, no ano 586 antes de Cristo. O povo cometia verdadeiros desatinos e recusava-se terminantemente a ouvir Jeremias (Jr 25.3). Entretanto, o profeta mistura o juízo que cairia sobre eles com o anúncio da reviravolta que sucederia o juízo. A diferença entre uma situação e outra é enorme.

Graças à reviravolta a ser experimentada por Israel depois do cativeiro babilônico, “o povo de Israel [o reino do Norte] e o povo de Judá [o reino do Sul] virão juntos, chorando e buscando o Senhor, o seu Deus. Virão e se apegarão ao Senhor numa aliança permanente que não será esquecida” (Jr 50.4-5). A bênção mais marcante dessa reviravolta não foi o retorno dos exilados nem a reconstrução da cidade e do templo de Jerusalém, setenta anos depois do exílio, mas a dissolução do pecado e da culpa. Quando esse dia chegou, mesmo procurando, ninguém achava iniqüidade em Israel nem pecados em Judá, pois Deus havia passado uma esponja em todo o remanescente (Jr 50.20).

Por sua vez, o pior período da história da igreja foi quando “nada era mais corrupto, pestilento e odioso do que a cúria romana”.1 Os que enxergavam a prolongada crise, cuja duração excedia trezentos anos, e esboçavam alguma reação eram excomungados, destituídos de suas funções, denunciados como “filhos da escuridão” e lançados nas fogueiras da inquisição, como aconteceu com João Huss (em 1415) e com Jerônimo Savonarola (em 1489). Porém, Deus não permitiu que a igreja naufragasse por completo e levantou homens na Europa Central e nas Ilhas Britânicas, que ele usou para provocar a maior, mais ampla e mais duradoura de todas as reviravoltas registradas na história eclesiástica, conhecida como Reforma Protestante do Século 16.

Resta perguntar se a igreja evangélica brasileira, embora crescendo em número, estaria precisando de uma reviravolta, para corrigir alguns rumos, algumas distorções, alguns escândalos e algumas omissões.


Fonte: Revista Ultimato

terça-feira, 24 de abril de 2012

É preciso parar de correr atrás do vento e de cavar cisternas que não retêm água!

Para você saber lidar com o muro da morte e passar para o outro lado dele... 

Para você ficar livre da eterna mesmice da vida (a intolerável rotina de sempre) e experimentar coisas novas e surpreendentes... 

Para você não ser obrigado a confessar, já velho e acabado, que sua vida foi uma vida boba, sem sentido e terrivelmente frustrante... 

Para você não correr atrás do vento como um bobo... 

Para você não repetir no final de cada dia, no final de cada semana, no final de cada mês, no final de cada ano, no final de cada aniversário, que “tudo é vaidade”... 

Para você se libertar de sua continuada depressão... 

Para você não cometer, em algum momento da vida, suicídio... 

“Lembre-se do seu Criador enquanto você ainda é jovem, antes que venham os dias maus e cheguem os anos em que você dirá: ‘Não tenho mais prazer na vida’” (Ec 12.1, NTLH). 

Substitua o "Memento Morti" (lembre que deve morrer) pelo "Memento Creatoris" (lembre-se do seu Criador). 

Desde que você busque a Deus em primeiro lugar e tenha o devido temor ao Senhor, não é necessário que você desapareça deste mundo (Jo 17.15) e construa um barraco no meio da floresta para se isolar de tudo e de todos. Não é necessário que você abra mão da sabedoria, do sucesso, dos prazeres da vida, do trabalho, da ascensão econômica, dos exercícios físicos, da alegria da música, da beleza, do amor, da família, da sociedade e dos sonhos. O livro de Eclesiastes ensina isso: “Jovem, aproveite a sua mocidade e seja feliz enquanto é moço. Faça tudo o que quiser e siga os desejos do seu coração. Mas lembre-se de uma coisa: Deus o julgará por tudo o que você fizer. Não deixe que nada o preocupe ou faça sofrer, pois a mocidade dura pouco” (Ec 11.9-10, NTLH). 

O Sábio usa três vezes uma palavrinha mágica no último capítulo de Eclesiastes. É preciso lembrar-se do tédio “antes que venham os dias maus” (Ec 12.1), "antes" do processo irreversível da decrepitude (Ec 12.2-6), "antes" da morte (Ec 12.6-8). Quanto mais tarde se toma essa decisão inteligente, maior vai se tornando o desperdício da vida e o consumo da amargura. É muito mais sábio acabar com a alienação de Deus no início da vida do que no final, quando a “lamparina de ouro cai e quebra”, quando a “corrente de prata se arrebenta”, quando o “pote de barro se despedaça e a corda do poço se parte” (Ec 12.6-7). 

O Eclesiastes é muito prático. Bastam as duas últimas frases do livro: “De tudo o que foi dito, a conclusão é esta: tema a Deus e obedeça aos seus mandamentos porque foi para isso que fomos criados. Nós teremos de prestar contas a Deus de tudo o que fizemos e até daquilo que fizemos em segredo, seja o bem ou o mal” (Ec 12.13-14, NTLH). 

A mensagem de Eclesiastes pode ser reencontrada em um versículo do profeta Jeremias: “O meu povo cometeu dois crimes: eles me abandonaram, a mim, a fonte de água viva; e cavaram as suas próprias cisternas, cisternas rachadas que não retêm água” (Jr 2.13). Correr atrás do vento e cavar cisternas rachadas a vida inteira são metáforas diferentes com mensagens iguais. As duas denunciam a falta de Deus na mente, no coração e na vida de qualquer ser humano que rodopia em torno de si mesmo. 

Chega da “vida boba”, “da triste maneira de viver”, chega de nostalgia (a saudade escondida de Deus), chega de arrogância, chega de teimosia, chega de incredulidade, chega de “correr atrás do vento”!